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Na performance duracional Poeira Branca o Grupo Em-cadeia emula um chão de fábrica onde se produzem e se destroem corpos. A complexidade prática e crítica proposta por esse coletivo artístico exige uma descrição apurada sobre o seu fazer. Instalado na sala digital do Museu Municipal de Arte (MuMA), o grupo dividiu o espaço em quatro áreas, sendo: um pequeno vestiário, uma área de produção, um estoque e o setor de quebra. Essas áreas de trabalho são delimitadas por faixas de segurança marcadas no chão, não tendo nenhuma parede fixa entre elas. O acesso ao público é por meio de paredes de vidros que dividem a área da performance com o espaço público da rua. Funcionando como uma vitrine, as pessoas conseguem somente ver os acontecimentos e a interação é mediada pelos vidros ou quando algum dos artistas sai da sala.

Com duração de três horas diárias, a performance começa com os/as cinco artistas entrando no espaço e se direcionando ao vestiário. Nele, há um banco, uma arara de roupas com cinco macacões brancos pendurados e logo abaixo cinco pares de sapatos também brancos. Em uma coluna estão pendurados óculos de produção e máscaras de respiração na cor laranja. Cada artista coloca a sua roupa e sapatos, cobrindo-se dos pés à cabeça, além de vestir suas respectivas máscaras e óculos. Um dos/as artistas liga uma TV acima do banco no vestiário mostrando uma contagem de tempo que se inicia do zero e logo após se direciona ao setor de estoque junto à parede de vidro e aciona um botão que dispara uma sirene de fábrica, anunciando o início dos trabalhos.

Na performance duracional Poeira Branca o Grupo Em-cadeia emula um chão de fábrica onde se produzem e se destroem corpos. A complexidade prática e crítica proposta por esse coletivo artístico exige uma descrição apurada sobre o seu fazer. Instalado na sala digital do Museu Municipal de Arte (MuMA), o grupo dividiu o espaço em quatro áreas, sendo: um pequeno vestiário, uma área de produção, um estoque e o setor de quebra. Essas áreas de trabalho são delimitadas por faixas de segurança marcadas no chão, não tendo nenhuma parede fixa entre elas. O acesso ao público é por meio de paredes de vidros que dividem a área da performance com o espaço público da rua. Funcionando como uma vitrine, as pessoas conseguem somente ver os acontecimentos e a interação é mediada pelos vidros ou quando algum dos artistas sai da sala.

Com duração de três horas diárias, a performance começa com os/as cinco artistas entrando no espaço e se direcionando ao vestiário. Nele, há um banco, uma arara de roupas com cinco macacões brancos pendurados e logo abaixo cinco pares de sapatos também brancos. Em uma coluna estão pendurados óculos de produção e máscaras de respiração na cor laranja. Cada artista coloca a sua roupa e sapatos, cobrindo-se dos pés à cabeça, além de vestir suas respectivas máscaras e óculos. Um dos/as artistas liga uma TV acima do banco no vestiário mostrando uma contagem de tempo que se inicia do zero e logo após se direciona ao setor de estoque junto à parede de vidro e aciona um botão que dispara uma sirene de fábrica, anunciando o início dos trabalhos.

Dois/duas artistas se direcionam à área da produção, colocam luvas, começam o preparo dos moldes, trabalhando o gesso para a produção das peças. Outro/a integrante do grupo segue para a área do estoque, onde se encontra um carrinho de mão, uma luva grossa nas cores branca e laranja e um monte composto pelas peças produzidas anteriormente e também por peças que foram quebradas. No setor de quebra, outro/a artista encontra uma mesa de plástico apoiada em uma estrutura de ferro e, em cima, uma luva, cinco tipos de marretas, sendo três de madeira e ferro e duas de madeira com cabeça de borracha, todas de formatos e tamanhos diferentes. Nessa área, mais ao fundo e junto à parede, há uma tela composta por quatro TVs em que é possível identificar uma planilha, mas que de fora do espaço não é possível visualizar o seu conteúdo. Por fim, o último artista, munido de uma prancheta com alguns papéis, acompanha o desempenho dos demais.

Durante 30 minutos, cada artista assume a sua função e trabalha arduamente para as cumprir. Os/as artistas do setor de produção dão forma às peças a partir dos moldes que depositam, um a um, sobre a mesa. Respeitando o tempo de secagem do gesso, finalizam a produção de cada uma das peças ao desenformá-la. O/a responsável pelo setor de estoque possui diversas funções. Ele/a recolhe as peças de gesso e as deposita cuidadosamente no carrinho de mão. Na sequência, encaminha as mesmas para o setor do estoque, onde as retira para depositá-las no monte. Em seguida, seleciona outras peças no mesmo monte, depositando-as no carrinho e as levando ao setor de quebra. Após dispor as peças em um local da mesa, retira de um modo não muito delicado os resíduos das peças quebradas para o mesmo carrinho. No seu retorno ao setor de estoque, despeja todo o resíduo de qualquer forma entornando o carrinho sobre o monte de peças. Além dessas funções de transporte e seleção, o mesmo integrante acumula a responsabilidade de repor a água utilizada no setor de produção, repor a água e o gesso utilizados no setor de produção e coletar os pedaços de gesso que caem no chão durante a quebra.

No setor de quebra, outro/a artista seleciona quais peças e ferramentas que irá utilizar em seu labor. Não há um modo padrão e observamos que para cada peça pode existir uma metodologia de trabalho diferente. Algumas vezes, uma peça grande e espessa demanda o uso da menor marreta — mais eficaz para partir em pequenos pedaços —, em outras a marreta maior pode ser mais eficiente para uma demolição mais rápida. As marretas com cabeça de borracha parecem muitas vezes ineficazes, mesmo assim, um/a ou outro/a artista acaba utilizando para transformar as pequenas pedras em pó branco. Por fim, o quinto integrante do grupo possui o papel de supervisão. Acompanha o trabalho dos demais, faz anotações em sua prancheta, verifica a planilha exposta na sala do setor de quebra e notifica ao/a responsável do setor de estoque sobre a necessidade de reposição da água e gesso no setor de produção. Por alguns momentos, sai da sala e se direciona para a rua e acompanha o trabalho dos/as demais trabalhadores, do outro lado do vidro. Nessa situação, quando é interpelado/a pelo público, o/a artista se eventualmente conversa com as pessoas, sem retirar a máscara ou o equipamento de proteção. Faz parte de suas funções acompanhar o cronômetro de trabalho, pois, após o ciclo de meia hora, deve acionar a sirene para avisar a troca de turno. Assim, a cada 30 minutos, acontece um rodízio de funções e setores. Desse modo, um dos integrantes do setor de produção se encaminha para o setor de estoque e o que ocupava essa função se transfere para o setor seguinte, o de quebra. Finalmente, quem estiver na quebra assume a supervisão e o antigo supervisor ocupa uma das funções no setor de produção.

Duas observações são necessárias quanto a essa performance, uma sobre a prática e outra sobre o corpo. Quanto à prática, Poeira Branca assume todas as características que a configuram como tal, desde a relação de imbricação entre ações básicas e complexas de cada artista à regra constitutiva que a define, no caso, produzir e quebrar corpos. As pequenas ações se inter-relacionam e não possuem uma hierarquia. Ou seja, ao invés de assumir uma estrutura teleológica, onde todas as ações são organizadas para um fim, a prática assume uma configuração ad infinitum. Podemos, inclusive, imaginar a composição das ações dos/as artistas como uma fita de Möebius, contudo, diferentemente de Caminhando de Lygia Clark, há um ponto em que se aglutinam: o monte de peças novas e resíduos no setor de estoque. Eis onde se sedimentam todos os rastros do fazer e todo sentido de suas ações na performance.

Quanto ao corpo, não há um corpo apenas, mas sim um jogo extraordinário de corpos. O filósofo P. F. Strawson distingue dois tipos de particulares básicos que identificamos no mundo: o corpo e a pessoa. Enquanto o corpo é um particular que recebe predicados físicos, o particular pessoa é de um tipo especial que recebe predicados tanto físicos quanto psíquicos. Em Poeira Branca há um processo de inversão desses particulares entre os corpos. Enquanto os/as artistas estão em ação, não conseguimos identificar quem é quem, a padronização de suas roupas e o enclausuramento de seus corpos nelas acabam por apagar suas identidades. As únicas diferenças entre eles são as características físicas de seus corpos e uma identificação com um número no macacão, na altura do peito. Na performance, os/as artistas deixam de ser pessoas para se transformarem somente em corpos que possuem funcionalidade única de trabalhar, e tão somente trabalhar. Não importa a função, rotacionada a cada meia hora, os corpos são o de um animal laborans, nos termos de Hannah Arendt, rendidos, usados e instrumentalizados por um homo faber.

A outra inversão entre corpos se refere às peças que produzem. Todos os moldes utilizados são de pedaços dos corpos humanos: costas, pernas, rosto, boca, orelha, pés, mãos etc. Mais precisamente, os moldes são dos corpos dos/as próprios/as artistas. Na produção criam a todo momento novas peças de gesso com dimensões reais do corpo humano, reproduzem seus próprios corpos para serem estocados e destruídos. Estes são, inicialmente, identificados como o particular básico corpo, conforme Strawson. Entretanto, com o passar dos dias e a sedimentação de peças e resíduos no setor de estoque, eles deixam de ser somente objetos e tornam-se corpos de pessoas, de tal modo que o monte de gesso se transmuta e transmite a sensação de carne. Tal sensação, ao deparar com um monte de resíduos e pedaços de corpos, faz alusão a acúmulo de mortos em decorrência das guerras e conflitos em curso como aqueles entre Rússia e Ucrânia, Israel na Faixa de Gaza ou, ainda, o que ocorre internamente no Sudão. Neles milhares de vidas são tiradas e o que resta são corpos, ou melhor, pedaços de corpos misturados às ruínas e destroços produzidos pela ação humana nessas guerras.

Em Poeira Branca, o Grupo Em-cadeia nos mostra que nossos corpos são descartáveis e que estamos cada vez mais alienados referente às nossas ações no mundo. Estamos sempre a fazer algo, a produzir alguma coisa, muitas vezes sem saber o porquê ou para qual fim. O que nos sobra nesse ir-e-vir insensato dos tempos atuais senão o pó composto também por nossas peles? Eis, pois, o resíduo que se sedimenta durante toda a ação, tomando todo o espaço e nos indicando que o que nos sobra é uma poeira, tão somente, uma poeira branca.

Fernando Ribeiro

Curador

Datas

Performance de 11/06/2025 a 06/07/2024

 

* Terças e quintas das 10h às 13h
* Quartas e sextas das 15h às 18h


* Sábados:

22/06/2024 das 10h às 13h
06/07/2024 das 10h às 11h
encerramento da performance + abertura da exposição até 14h

Exposição de 11/06/2025 a 28/07/2024

1° semana

2° semana

3° semana

4° semana

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Dados de produtividade:

Informações recolhidas diariamente pelo responsável no controle, durante os turnos de trabalho:

Durante quatro semanas, dentro de uma vitrine voltada para a rua, vivenciamos uma rotina rígida de trabalho, produzindo e destruindo fragmentos dos nossos corpos moldados em gesso.

Cansaço constante, calor extremo, equipamento de segurança cravado na pele, tempo implacável e infinito. A rotina de um trabalhador. 

As funções se tornam mecanizadas, as peças produzidas se acumulam, a pilha de corpos cresce e o chão, preenchido pela poeira do gesso, se torna escorregadio. Nossos passos são medidos, os movimentos controlados, o suor escorre em nossas costas, mas a produção não para.

 

O som da marreta marca a destruição de outra peça. Construída e transportada cuidadosamente, volta a ser poeira, enquanto os turnos se alternam e o relógio reinicia.

Grupo Em-cadeia

Grupo Em-Cadeia apresenta nova intervenção no MuMA, a partir de 11 de junho, em uma reflexão sobre o sentido da produção no mundo contemporâneo:

A partir de 11 de junho, o Museu Municipal de Arte (Muma) se tornará palco para uma reflexão profunda sobre os desafios do mundo contemporâneo, incluindo epidemias, conflitos, destruição ambiental e autoritarismo. Sob o título de Poeira Branca, o coletivo de arte Grupo Em-Cadeia traz uma proposta ousada, explorando o papel da produção industrial como potencial solução e causa desses problemas. O projeto é realizado com recursos da Lei Municipal de Fomento e Incentivo à Cultura (Mecenato). 

Na performance, os jovens artistas Barbara Haro, Isabela Picheth, Luiz Moreira, Luiza Urban e Priscilla Durigan serão vistos atrás de uma vitrine de vidro, imersos em um ambiente que replica uma linha de produção industrial. Durante um mês, eles seguirão rigorosamente normas industriais, trabalhando com gesso - material associado à escultura, mas com ampla utilização na construção civil. No entanto, o que diferencia essa performance é o destino final dos produtos: uma vez concluídos, eles serão destruídos pelos próprios criadores.

"Com a performance duracional, os artistas transportam a estrutura industrial para o espaço expositivo, mas vão além, subvertendo essa lógica ao incluir a destruição do produto na própria linha de produção", afirma o curador Fernando Ribeiro. Desta forma, os artistas convidam o público a produzir sua própria reflexão sobre individualidade, fragilidade, lógica e irracionalidade. 

Concebida em 2020 durante o isolamento social da pandemia de Covid-19, Poeira Branca recria um ambiente esterilizado e mecanizado, onde corpos são apenas formas anônimas. O gesso, inicialmente um pó branco fino, retorna a essa forma ao ser destruído. Ao levantar no ar, forma uma neblina que obscurece a visão, tornando os contornos difusos. "Essa sujeira branca, ao se espalhar, marca não só a presença dos corpos, mas também seus movimentos, conectando o espectador com a materialidade da performance", explica o curador.

Poeira Branca desafia a necessidade de produção incessante em um mundo marcado pela excessiva produção e desperdício. Após o período de performance, os resíduos do processo ficarão expostos por duas semanas no museu.

Material didático

O projeto Poeira Branca, realizado com recursos da Lei Municipal de Fomento e Incentivo à Cultura (Mecenato), conta com uma série de ações voltadas para a contrapartida social, que envolve educação e democratização do trabalho artístico. Entre estas ações destaca-se o material pedagógico criado para contextualizar tanto a linguagem da performance utilizada na realização do trabalho, quanto o próprio conceito e processo de criação desenvolvidos pelos artistas. Através da capacitação de professores, o arte-educador Bruno Wozniak, vai orientar a abordagem dos temas antes da visita dos alunos à exposição.

Eventos do projeto:

Mediador no espaço expositivo;

Oficina para pessoas cegas e baixa-visão;

Visita de turma do ensino médio e ida da equipe para a escola;

Bolsista selecionado;

 

Bate-papo com o grupo e curador na UNESPAR Campus I - EMBAP;

23.07.2024 / às 19h

FICHA TÉCNICA
Curadoria: Fernando Ribeiro
Criação e Performance: Barbara Haro, Isabela Picheth, Luiz Moreira, Luiza Urban e Priscilla Durigan
Direção de Produção: Diego Marchioro
Projeto Educativo e Mediação: Bruno Wozniack

Fotos: Patricia Mattos
Vídeos: Luiz Moreira e Lidia Ueta
Designer Gráfico: Barbara Haro
Estratégia Digital e Mídias Sociais: Barbara Haro e Luiza Urban
Estagiária: Gabriella Santos

Assessoria de Imprensa: Dani Brito
Cenotécnico: Fabiano Hoffmann
Realização: Grupo Em-cadeia e Rumo de Cultura
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